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A infância é necessária?

Caríssimos,
O blog Chutebol traz um texto de Neil Postman, autor norte-americano teórico da comunicação. Postman traduziu sua preocupação com a infância em seu célebre ‘O desaparecimento da Infância‘, em que nos lembra que a infância não é algo biológico, nem uma criação do divino, mas uma construção social. E, como tal, pode ser preservada ou descartada por uma sociedade. Acreditamos, na verdade, que não se trata de demonizar o século XXI, nem de fazer uma caça às bruxas midiática, mas sim de assumir uma postura crítica e procurar compreender melhor o que está se passando. A figura do adulto infantilizado é débil, assim como a da criança adultificada é precária, e causa sofrimento.
“Até aqui dirigi meus esforços no sentido de descrever como a arena simbólica em que uma sociedade se conduz tornará a infância necessária ou irrelevante. Tenho em especial tentado explicar como a nossa nova e revolucionária mídia vem causando a expulsão da infância depois de sua longa permanência na civilização ocidental. Resta-me apresentar algumas das evidências diretas de que essa expulsão está de fato em andamento.
(…) Há evidência, por exemplo, a ser observada na fusão do gosto e estilo de crianças e adultos assim como nas mutáveis perspectivas de instituições sociais importantes como o direito, as escolas e os esportes. (…) Gostaria de começar, então, chamando a atenção para o fato de que as crianças praticamente desapareceram da mídia, especialmente da televisão. Não quero dizer, claro, que pessoas de pouca idade não possam ser vistas. Quero dizer que, quando são mostradas, são representadas como adultos em miniatura. (…) Um espectador atento das comédias de costumes, das novelas ou de qualquer outro formato popular da TV notará que as crianças de tais programas não diferem significativamente em seus interesses, na linguagem, nas roupas ou na sexualidade dos adultos dos mesmos programas.
(…) Se olharmos de perto o conteúdo das programações, podemos encontrar uma documentação bastante precisa não só da ascensão da ‘criança adultificada‘, mas também do ‘adulto infantilizado‘. A televisão é tão clara a esse respeito quanto é a respeito de praticamente qualquer outra coisa. Nas competições organizadas em programas de auditório, por exemplo, os participantes são selecionados cuidadosamente (por um suposto adulto, o apresentador), para assegurar que a tolerância deles para com a humilhação seja inesgotável (…).
(…) A indústria de roupas de criança passou por grandes mudanças (…), de modo que o que era outrora inequivocamente reconhecido como roupa infantil praticamente desapareceu. Garotos agora usam roupas sociais nas festas de aniversário (…). À medida que o conceito de infância diminui, os indicadores simbólicos da infância diminuem com ele.
Esse processo pode ser observado não só nas roupas mas também nos hábitos alimentares. A refeição ligeira e de má qualidade, antes só apreciada pelos paladares menos exigentes e pelo estômago de avestruz do jovem, é agora a alimentação comum entre adultos. Isto pode ser inferido dos comerciais do McDonald’s e do Burger King, que não fazem distinção de idade nas suas campanhas publicitárias. Basta ver a proporção de crianças e adultos que frequentam tais lugares. Ao que parece, os adultos consomem pelo menos tanta comida ruim quanto as crianças.
(…) Na verdade, era um sinal de amadurecimento quando um jovem se mostrava mais inclinado a rejeitar o tipo de alimentação que dá nome à indústria do junk-food. Creio que podemos dizer com convicção que este sinalizador da transição para a idade adulta está agora inteiramente esquecido.”
[Adaptado de ‘O desaparecimento da Infância‘, Neil Postman, 1994]
*Você acha necessário preservar a ideia de infância? Por quê?

Aquele abraço, saudações esportivas

This Post Has 5 Comments

  1. Pois é gente, na verdade não se trata de idealizar a infância, mas de assumir um compromisso com ela, no sentido de ser o momento e o espaço por excelência da formação de cada um de nós – e isso leva tempo, há que se construir e sustentar um ambiente propício, confortável, mas que também leve ao crescimento – o que não é moleza!
    Grande abraço!

  2. O adulto vive num mundo de competição quase sem regras, em que amor e moral não são valores muito cultivados. Da infância é que trago os aprendizados mais recônditos de lealdade, amizade, carinho e prazer, valores e conhecimentos que nos acompanham pelo resto da vida.

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