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De virada

A semana futebolística foi farta: num punhado de dias, ofereceu três viradas espetaculares – do Fluminense pra cima do Grêmio, do Liverpool pra cima do Barça e, não menos admirável, do Tottenham pra cima do Ajax.

Curioso falar, atualmente, destes torneios de times europeus com a maior naturalidade do mundo ao lembrar da própria infância (quando não tínhamos acesso a estes jogos), e que bom poder desfrutar deles!

Numa das aulas da semana, dois meninos estavam meio assustados na hora do jogo, pois na equipe adversária estava um jogador que temiam. Eles são bons de bola, mas ainda assim jogaram um primeiro tempo visivelmente abaixo do que podem render.

Decidi chegar no pé do ouvido e tentar entender. Meu diagnóstico se mostrou correto, era medo mesmo. Me ocorreu então a lembrança dos jogos do Fluminense e do Liverpool, e pudemos conversar sobre como é sentir medo de jogar, de enfrentar.

(Eu mal sabia que, à tarde, naquele mesmo dia, o vistoso e eficiente time do Ajax seria eliminado de forma dolorosa por um corajoso Tottenham).

Pois os meninos falaram, admitiram o medo do fulaninho. Porcurei escutar atento (crianças notam a diferença se você está escutanto de verdade), e o que pude oferecer como retorno foi… a vida real.

Não um incentivo gratuito e batido, do tipo “Ah, o importante é se divertir”; ou uma exigência imperativa sem sentido ali, como “Joguem com raça”; muito menos um slogan narcisista desses da moda, “Sejam assim ou assado”.

Ao contrário, o que sensibilizou os rapazes e os fez conversar abertamente foi contar a própria experiência que viveram, ao assistirem às partidas profissionais em que houve uma virada. Puderam se colocar no lugar dos jogadores.

O que fazer na hora difícil? Como reagir diante de uma situação adversa? Ao falarem, se mostravam realmente sensibilizados e percebi uma pequena mudança no semblante. Relaxaram um pouco ao admitir o medo. Falar é sentir.

O futebol moderno, mesmo equipado com todo o arsenal de patrocínios, gel no cabelo e ingressos caros, ainda encanta porque pode oferecer a possibilidade da tragédia. Do drama. Da vida real e do imaginário, das histórias míticas.

Aqueles jogadores de grife, que a meninada tanto admira, sofrem e reagem diante das câmeras, quando o bicho pega, alheios ao aparato midiático. O trágico empresta beleza ao esporte. Existe algo radicalmente humano que – ainda – é preservado.

Pois é justamente a possibilidade de travessia da tragédia, acredito, o maior potencial educativo do futebol. ‘Vencer’ é um imperativo que deve estar subordinado a ‘Jogar’. O herói não é aquele que tem que vencer. Ele, justamente, não sabe se vai vencer. Não há garantias.

Ter que vencer, aliás, é um inferno. A meu ver, a conotação de vitória nos maravilhosos jogos dessa semana foi outra.

Vencer, como consequência de um caminho percorrido: jogar –  descer do trono, travar o bom combate, sentir medo de perder, confrontar-se com a própria fragilidade. Arriscar, se lançar ao imprevisível.

Meus amigos voltaram para o segundo tempo e arrancaram um empate. Para eles, àquela altura, heróico, mui heróico.

Aquele abraço, saudações esportivas

This Post Has 6 Comments

  1. olá rodrigo.
    que texto lindo. parabéns. que bom que o nosso filho está se experimentando no futebol perto de vc, com vc.
    obrigada
    beijo

  2. Fala Tupi. Também não perdi a oportunidade de comentar essas viradas . Eles comentaram sobre a Copinha ano passado . Islândia perdendo o primeiro tempo de 3 x 0 e virando para 4 x 3 . Não fica fictício , é a vida real . E como você bem disse não basta falar . Tem que falar olhando no olho deles . Vou te mandar uma postagem minha no Instagram . Abraço

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