Drama adolescente

Por Rodrigo Tupinamba Carvao
em 16/04/2025 |
Categorias: ChutebolEducação

O aluno parecia introspectivo, um pouco mais distante que de costume. Normalmente brincalhão, seguia o treino com os colegas sem, no entanto, derramar-se na quadra como de hábito. O professor percebeu, resolveu respeitar.

Adolescência é tempo que envolve certo mistério. Das dúvidas sobre o que se foi e o que será, do que pode e o que não pode, de quem deseja ser. Este processo complexo, sofisticado e delicado – mesmo que apareça muitas vezes de forma bruta – necessita de uma elaboração.

Em que pese a necessidade evidente de apoio (escola, amigos, familiares), existe algo de muito solitário neste processo, algo que só o sujeito deverá viver.

É uma espécie de prova dos nove porque, a depender de experiências anteriores (infância); da confiança no ambiente (presente); e das possibilidades de identificação (futuro), ações e pensamentos vão tomando esta ou aquela forma.

A solidão adolescente é, mais do que um momento, um período necessário para que o psiquismo se reorganize diante de novas demandas e desejos (do sujeito e do ambiente). Tal solidão, no entanto, poderá ser um período de amadurecimento ou, ao contrário, de profunda desilusão.

Nos casos em que há certa consistência subjetiva (sensação de pertencimento, sentido, amizades e possibilidades afetivas verdadeiras), as tristezas, agressividade e confusões próprias da adolescência vão tecendo um caldo emocional, uma trama complexa que, adiante, irá empurrar à vida adulta e ao desejo de emancipar-se entremeado ao laço social.

Ao contrário, meninos e meninas com fragilidades expostas e demandas afetivas muito latentes (atuais e/ou infantis) cobram a fatura e, diante do sentimento de solidão ao qual me referi, podem cair num vazio muito profundo e assustador.

A precariedade de espaços públicos seguros, a vivência amedrontada da cidade, a pouca emancipação para resolver problemas ao alcance da idade convidam a um isolamento artificial, notadamente em nosso tempo a fuga para a tecnologia e o espaço sem lei das redes sociais – em que reina uma socialização estereotipada e muitas vezes violenta.

É a partir desta sensação de vazio (falta de sentido; de perspectiva; de imagem de si) que ocorrem os episódios mais difíceis de lidar, quando não verdadeiramente cruéis e transgressores em sentido grave. Nestes casos, pode-se dizer que é alguém que realmente ‘não sabe o que faz’ – embora já consiga falar, raciocinar e agir até mesmo com pose de adulto.

Estou tentando dizer que a solidão adolescente não é algo necessariamente ruim, mas um processo inevitável no qual, a depender do que ela significar para o sujeito – nas bases que tentei colocar – pode ser algo a enriquecer sua vida, ou a viver dramas impensáveis.

O aluno da história retornou no treino seguinte, de mãos dadas com a namorada. Sorridente e brincalhão, como de hábito.

Creio que aquele momento solitário não era um vazio, mas a elaboração de um afeto amoroso.

Aquele abraço, saudações esportivas

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2 Comments

  1. Marcelo abril 16, 2025 at 6:23 pm - Reply

    Lindo texto, Rodrigo!

    Posso compartilhar?

  2. Roberta abril 16, 2025 at 6:24 pm - Reply

    Obrigada pelo texto!
    O medo que dá…
    Mas seguimos, sempre com diálogo aberto!
    Bjs

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