Mais o quê?

Por Rodrigo Tupinamba Carvao
em 15/09/2015 |
Categorias: Sem categoria
Caros (as),
Temos percebido, de uns tempos pra cá, como está em queda a participação dos adolescentes nos treinos e nos torneios de que temos participado. Digo isto por ser uma percepção geral de colegas do meio profissional. Sim, claro: por adolescentes enfatizo uma idade entre 13 e 15 anos, que sempre foi muito presente, com gana de jogar.

Normalmente entre os seis e os dez anos de idade há uma curva ascendente, um ápice no número de alunos que praticam esportes, em nosso caso, o Futsal. Embora, de acordo com a prática – e o mesmo diz a literatura sobre o assunto – exista uma curva normalmente descendente a partir dos onze ou doze anos, a percepção atual é de uma queda muito acentuada. Estou tentando dizer que muitos meninos e meninas em idade ótima para o esporte não estão comparecendo, como noutros tempos, aos campos e quadras. 
Ano após ano, isso tem se tornado mais difícil. Como é difícil, acredito, para a molecada que ainda se amarra e vai lá treinar, e quer jogar, brincar, competir, medir forças – nada mais próprio deste período da vida. “Puxa, antes tinha mais gente né?“, eles resmungam.
Cabe perguntar: por quê?
Dentre os motivos que escuto deles próprios está, simplesmente, tudo aquilo que cabe no vasto, confuso e belo mundo adolescente, com suas dúvidas sobre a vida, seus modelos de identificação, suas angústias e suas delícias. Ponto. Cabe assim um golpe amoroso fatal que tirou do cara a vontade de jogar; o videogame que é legal com os amigos até do Japão; a virada por outras preferências (surfar, lutar jiu-jitsu, jogar capoeira); as séries americanas que deixam os pais alucinados (quando não assistem juntos). Enfim, bem sabemos que atualmente existem questões relacionadas a uma certa apatia, uma passividade assombrada pelas telinhas e pelo mundo virtual, mas esse não é o ponto que pretendo fazer agora.
Os caminhos, as preferências, as atividades, vão mudando de acordo com as mudanças do mundo. Mas há nesta trama algo cada vez mais presente: as exigências escolares estão, para muitos deles, beirando o insuportável. Muita gente em idade privilegiada (os 13 aos 15 que me referi acima) tem deixado de jogar bola ou praticar um esporte simplesmente porque não dá tempo. Tempo? Duas horas semanais. Se-ma-nais. Fiquei pensando.

O psicanalista inglês Donald Woods Winnicott, ao falar da adolescência, sustentou que ela é uma espécie de estado patológico normal. Percebam a sutileza do paradoxo. Estado patológico normal. Me parece brilhante, pois é a partir da experiência das contradições vividas aí (psíquicas, fisiológicas, sociais, existenciais) que vai emergir um novo sujeito, normalmente meio esquisito à primeira vista – mas, se tudo correr mais ou menos como deve ser, um sujeito singular.

Quer dizer: se a vida está mais competitiva, se o mercado está mais competitivo, se as escolas, o vestibular, o ENEM e o diabo a quatro estão mais duros sob este aspecto e exigem mais da molecada, é forçoso perguntar: ‘mais’, o quê? Falei do futebol porque é o nosso metiê, mas isso pode se aplicar a qualquer outro meio não-acadêmico. 

Há uma crise de adolescência a ser vivida. No sentido da transformação, do turbilhão – que vai se apresentar em cada um das maneiras mais inusitadas. Aliás, quem não lembra da sua, achando que não a viveu, pode até se ressentir disso. Se não no futebol, noutras praias. E, se por um lado é preciso que o adulto se indisponha para apresentar os limites, diante das confusões próprias do período, por outro é preciso ter em mente que ali há uma ebulição a ser vivida, experimentada, sofrida até. Acompanhada.

E eu duvido que duas horas semanais de um futebol, um surfe, uma luta, um violão, um teatro ou qualquer outra atividade criativa e afetiva não possam dar a sua contribuição de sagacidade, solidariedade e alguma estética na vida dessa garotada que está aí pro mundo. São espaços por excelência em que o camarada pode até chutar a bola pro mato.

Aquele abraço, saudações esportivas

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6 Comments

  1. Renata Brandão setembro 16, 2015 at 3:26 am - Reply

    Belo texto! Essa busca pelo que seria "o sucesso", essa preocupação com um futuro, parece que tudo isso acaba deixando em um segundo plano o agora, o que , talvez, seja pra gente a fase mais importante se ser vivida ao pé da letra. Viver as peculiaridades de cada fase preparam melhor pro futuro que qualquer cursinho , né? É preciso viver a dor e a delícia de cada etapa, se não a gente empaca! Dosar esse tempo "ideal" pode ser tarefa difícil. Vale a reflexão!

  2. Rodrigo Tupinambá Carvão setembro 16, 2015 at 11:55 am - Reply

    Pois é Renata, lembrei do Gil: "muitas vezes, a diferença do remédio pro veneno é… a dose!"

    Beijos!

  3. Anônimo setembro 16, 2015 at 12:13 pm - Reply

    Voce ta ficando bom, cara!

    Parabéns.

    T.

  4. Rodrigo Tupinambá Carvão setembro 16, 2015 at 12:13 pm - Reply

    =)

  5. TÂNIA VELOZO setembro 16, 2015 at 4:13 pm - Reply

    Reflexão importantissima!!!
    Bastante oportuno Rodrigo!
    A garotada está precisando respirar….relaxar!!!
    Na torcida por tardes e manhãs com turnas completas independente dos exagerados calendarios de provas!!!!

  6. TÂNIA VELOZO setembro 16, 2015 at 4:13 pm - Reply

    Reflexão importantissima!!!
    Bastante oportuno Rodrigo!
    A garotada está precisando respirar….relaxar!!!
    Na torcida por tardes e manhãs com turnas completas independente dos exagerados calendarios de provas!!!!

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