

Na bola
Os meninos brincavam, quase sempre, do mesmo jogo na parte inicial da aula.
Não se juntavam aos demais, organizavam seu próprio golzinho e passavam, ali, todo o tempo livre de aquecimento – a desfrutar e brincar.
Após semanas, talvez meses, era tentador incentivar outras formas de jogar, uma inserção maior com a turma etc. Mas insistiam, a ponto de o professor se convencer de que realmente precisavam daquele tempo.
Tempo este que passou e, quando se deu conta o professor, lá estavam aqueles meninos metidos no meio da turma, embolados no que chamamos de ‘luta pela vida’ – o jogo de driblinho que a maioria gosta antes dos treinos formais.
No tempo deles.
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Brincando, as crianças obtém a benfazeja ilusão de controlar o mundo ao seu modo. Na mistura entre fantasia e realidade podem se aventurar, experimentar, até ganhar confiança para colocar o pé na realidade de outra forma, com uma espécie de mundo particular garantido.
Na resenha acima, poder compartilhar de outra brincadeira, já tendo vivido suficiente aquela que, inicialmente, era possível. Além disso, o amadurecimento de valências físicas (força, tônus muscular, equilíbrio, orientação no espaço) que promove um sentimento de potência individual.
Atropelar este tempo em nome de qualquer aprendizagem mais visível aos olhos do adulto é bastante tentador, mas contraproducente.
Logo ali adiante, numa partida mais dura, as fragilidades de um tempo não vivido irão aparecer: em forma de um choro ressentido, de uma reclamação muito infantil para a idade, ou mesmo uma fragilidade motora.
Ao contrário, acatar o tempo como matéria-prima é uma aposta no tempo pessoal da criança, o que, naturalmente, não impede um empurrãozinho aqui e acolá.
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Os meninos da pequena história puderam se beneficiar, ainda, daquilo que chamamos ambiente seguro.
Uma rotina, previsível, na qual puderam experimentar o corpo, o espaço e o tempo, sem interferências danosas – como por exemplo uma pressão por desempenho; pressão por demonstração de força e agressividade ou, como vemos infelizmente no futebol profissional e amador no país, ganhar na marra ou ‘na porrada‘.
A necessidade em cultivar ambientes seguros na infância é primordial para o amadurecimento em todos os sentidos. Quando isto acontece, um sentimento de segurança interna permite à pessoa arriscar-se nas diversas frentes da vida, pois não esteve sob qualquer ataque iminente.
Ao contrário, quando ficamos acuados e não nos sentimos seguros, costumamos fugir dos desafios – ou atacar/revidar de maneira indevida e tola.
Quem está seguro de si se preocupa apenas em jogar bom futebol.
Aquele abraço, saudações esportivas