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Segurança

Prezados (as),

O blog Chutebol traz um antigo texto do psicanalista inglês Donald Woods Winnicott, no qual ele fala sobre algo muito importante na vida e no desenvolvimento da criança: a sensação de segurança. Como o autor aponta, tal sentimento é, como muitos outros, algo a ser vivido (experimentado, construído) pelo sujeito em sua relação com o ambiente que o circunda: questões como a disciplina, os desafios infantis, a ideia de liberdade e o que ele chama de relação viva entre pais e filhos. No panorama atual, em que a liberalização dos costumes pode ser algo confundida até com um abandono diante das demandas infantis, convém lembrar que, como disse um eremita da montanha, a diferença do remédio pro veneno é a dose…
Daí que o texto é antigo, mas a questão é atual. Boa leitura!

[A brincadeira sempre ajuda!]
Sempre que se faz uma tentativa de enumerar as necessidades básicas de bebês e crianças maiores, ouvimos que ‘as crianças precisam de segurança‘. Às vezes consideramos essa opinião razoável, às vezes nem tanto. Poderíamos perguntar: o que se quer dizer com a palavra ‘segurança’? É certo que pais superprotetores deixam seus filhos aflitos, assim como pais pouco confiáveis tornam as crianças confusas e amedrontadas. É evidente, assim, que a segurança pode vir em excesso, e no entanto sabemos que as crianças precisam sentir-se seguras. Como entender a questão? (…)

As crianças veem na segurança uma espécie de desafio, que as convida a provar que podem ser livres. A ideia de que a segurança é uma coisa boa identificar-se-ia, no limite, com a noção de que a prisão é um bom lugar para crescer. Isso seria absurdo. É claro que o espírito pode ser livre em qualquer lugar, mesmo numa prisão. (…) Mas as pessoas precisam viver livres para viver com imaginação. A liberdade é algo fundamental, que descobre nas pessoas o que elas têm de melhor. Não obstante, convém admitir que alguns indivíduos não podem viver em liberdade, por temerem a si mesmo e ao mundo (…).

As crianças nos dão sinal certo de sua boa saúde quando começam a ser capazes de desfrutar da liberdade que cada vez mais lhes conferimos. O que almejamos na educação das crianças? Esperamos que cada uma aos poucos adquira um sentido de segurança. É necessário que se edifique, no interior de cada criança, a crença em algo que não seja apenas bom, mas seja também confiável e durável, ou capaz de recuperar-se depois de se ter machucado ou mesmo perecido (…)

As crianças sadias necessitam de quem lhes imponha um certo controle; mas os indivíduos que impõem a disciplina devem poder ser amados e odiados, desafiados e chamados a ajudar ; os controles mecânicos não têm aí qualquer utilidade, e o medo não é o instrumento mais adequado para estimular a colaboração. É sempre um relacionamento vivo entre duas pessoas que abre espaço ao crescimento (…).

Felizmente, na maioria dos casos, pais e filhos são aliviados de seus fardos pela imaginação, pelas brincadeiras e pelas experiências culturais. Com o tempo, e com saúde, as crianças tornam-se capazes de conservar um sentido de segurança mesmo frente à insegurança mais manifesta, como por exemplo em caso de doença ou morte de um dos pais, no caso de um comportamento inesperado por parte de alguém, ou quando o lar, por uma ou outra razão, se desfaz (…).

Quando saudáveis, pois, as crianças desenvolvem suficientemente bem uma crença em si mesmas e nos outros, o que faz com que passem a odiar todo tipo de controle externo; o controle se muda em autocontrole. Neste, o conflito é trabalhado com antecedência no interior da própria pessoa. É assim, pois, que entendo a questão: as boas condições de cuidado num primeiro estágio de vida geram um sentido de segurança, que por sua vez gera o autocontrole; e, quando o autocontrole se realiza de fato, a segurança imposta do exterior, mais tarde, transforma-se num insulto”.
[Adaptado de ‘Segurança‘, em: ‘A família e o desenvolvimento individual‘ – D. W. Winnicott, 1960]

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