Fazer nada
É verdade que temos muitos cuidados com a infância: cuidados médicos, cognitivos, especialistas diversos, enfim, toda uma compreensão do que um sujeito precisa para crescer e se desenvolver de acordo com os ideais que representam seu nicho social. Isso é bom. Mas cabe a pergunta: qual é o tempo da infância? No que se diferencia da vivência adulta do tempo? É tão somente uma preparação para a idade adulta, com o preenchimento, pelo sujeito, de toda sorte de atributos que vão fazê-lo capaz de operar uma certa função social? É esta nossa escolha para a infância?
Porque se o pequeno aluno pediu, explicitamente, tempo para o ócio, (percebam, não era para brincar de bola ou de qualquer outra coisa), considero isso sinal de saúde. É tempo para o devaneio, para viver o vazio, até mesmo o tédio. Tudo soa como uma espécie de reação incontida ao tempo comprimido vivido pela meninice atual.
O amadurecimento dos potenciais da criança, para além das necessárias capacidades cognitivas, demanda um tempo próprio. Que é o tempo do brincar, do não fazer nada – até para poder imaginar, criar algo a partir desse vazio de imperativos (escola, cursinho, inglês, terapeuta etc). Quando falo em potenciais, me refiro principalmente à capacidade de ser espontâneo e criativo. Estes dois termos podem soar românticos ou ingênuos mas são, na verdade, os alicerces das melhores capacidades sociais e afetivas, e não são poucas as crianças que nos chegam carecendo de um empurrão neste sentido.
Pois bem, sem idealizar o passado, mas pensando alto: além dos cuidados dos especialistas, no que difere atualmente o tempo da criança do tempo do adulto? Esta resposta está clara para nós, hoje em dia? Ou melhor: nas condições da rotina em que vivemos, como é possível – se assim desejarmos – sustentar um tempo singular para a infância?
Aquele abraço, saudações esportivas
Adorei o post Rodrigo!
O Teo foi um desses, disse que nas férias não queria ir nem ao futebol nem ao judô. Perguntei se ele não gostava das atividades e ele respondeu que sim, que gosta, mas que estava de férias. E que nas férias ele queria brincar o dia inteiro, desde a hora que acordasse até a hora de ir dormir. Achei graça, mas resolvi respeitar, afinal, não tinha nem como contra-argumentar. Férias são férias, não é verdade?!
Bjs,
Cecília
Outra vez: Muito bom, Rodrigo. Excelente a sua percepção e o seu comentário. "Pensem bem, pais e mães, sobre o que vocês estão fazendo com (ou de) seus filhos." É essa a mensagem, não?
Abração.
Valeu a força!
Rodrigo,
Ótimo texto, como de costume. Aliás, seus textos estão na categoria dos que não deixo para depois – leio assim que chegam.
O Felipe foi um que fez tal pedido: ficar sem fazer nada. Mas lembrei-me de um fato contraditório: é comum, no dia-a-dia, ele dar sinais de que não consegue ficar sem fazer algo por um minuto que seja: “o que eu vou fazer agora”? (Não estou bem certo, mas talvez isso aconteça mais quando eu mando ele parar de jogar videogames, como quem diz: “se eu não jogar, vou ficar te importunando”…). Eu estranho que ele não consiga ficar sem fazer nada. Porém, neste caso das férias, foi como você relatou. Depreendo que ele encara o futebol e a natação como compromissos, embora se divirta neles. De fato, tem horário, instrutor, regras… coisas que não combinam com a ideia de férias.
Sou bastante atento a esse problema de não sobrecarregar a criança com compromissos. Porém, na minha infância, em que havia menos compromissos, o tempo livre era preenchido com atividades variadas, que o pequeno quintal da casa, os amigos da rua e o clube, ao qual eu ia a pé e sozinho, proporcionavam. Além de… ficar à toa! Deitado no quintal, olhando para o céu… Já no caso do meu filho, o tempo que não é preenchido com o inglês, a natação, o futebol e o dever de casa é consumido na maior parte com a TV e o videogame. E também, felizmente, com algumas brincadeiras de imaginação, com bonecos dos Angry Birds ou Gogos (do álbum da Disney). Não sou radical contra os games, vejo-os como um brinquedo dos dias atuais, mas é bem claro para mim que seu uso excessivo deve ser evitado.
Enfim, como a alternativa predominante é o game e não o ficar à toa, alguns compromissos são muito bem-vindos. Penso que o importante, como em muitas outras coisas, é não exagerar e procurar um equilíbrio.
Um abraço e obrigado pelo texto!
Grande abraço! Parabéns pelo ótimo trabalho que vocês vem realizando com as crianças.
Ana Beatriz
Pois é Estevão, esse é precisamente o ponto: a criança ainda se vê em condições de 'fazer nada'? Se não, o que isso acarreta em seu desenvolvimento? Isso, a meu ver, é algo muito importante a ser pensado – e escolhido – pela sociedade.
Grande abraço