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Futebol é guerra?

Caríssimos,
O blog Chutebol traz um texto do sociólogo brasileiro Maurício Murad, um estudioso da violência relacionada ao futebol. Murad questiona, por exemplo se o correto seria nos referirmos à violência no futebol, ou do futebol? E, de quebra nos faz refletir sobre as comparações com a guerra, tão utilizada para motivações e estratégias. Como costumamos conversar com nossos alunos: sem adversário, simplesmente não tem jogo! Ou como nos disse um sábio pimpolho: “Não tem problema perder essa partida, isso é só um jogo de futebol.” É?

[Clique na charge de André Dahmer!]
“Há uma tendência na sociologia que afirma que o futebol (o esporte, em geral) (…) é um ritual de ‘violência simbólica’, uma ‘guerra simbólica‘ e, por isso, tem um sentido ‘civilizacional’ (Elias, 1994a), pois evita e/ou esvazia a violência direta, material. Uma espécie aproximada, talvez, de solução ritual do conflito.
E seria esse frágil limite, entre o real e o simbólico, que ajudaria a explicar o fenômeno do conflito, da agressão, da violência no futebol. Potencialmente, essa estaria sempre pronta a ultrapassar as fronteiras da ordem, da lei, das regras e do controle social. Sua manifestação ficaria a depender, tão-somente, de algum estímulo externo: anomia, impunidade, descaso das autoridades, conexão com outros níveis de agressividade direta (drogas, xenofonia, racismo) ou indireta (pobreza, desemprego, exclusão).
Sim, evidente, é possível questionar a premissa de tal raciocínio, tendo em vista que o conceito de guerra, pelo menos em seu sentido historiográfico moderno e contemporâneo, não se encaixaria em disputas esportivas se observado em todo o seu rigor.
Isso porque a guerra pressupõe a eliminação do ‘outro’ e é consequência de uma razão de estado (Clausewitz, 1996), ao passo que o conflito esportivo, dentro ou fora dos gramados, prevê a permanência do outro, a continuidade sistêmica do outro, que não pode ser excluído, sob pena de se desfazer tudo, de implodir a lógica própria daquela rede (Latour, 1997).
Então, para a leitura da violência no futebol, mais especificamente no caso brasileiro, poderíamos pensar como possíveis alternativas (não únicas, é óbvio) as conceituações teórico-metodológicas, ‘padrões de convívio humano’, ‘uma ética de fundo emotivo’ e ‘homem cordial‘, categorias definidoras da obra Raízes do Brasil, clássico da nossa sociologia, se Sérgio Buarque de Holanda, de 1936.
Tomados em seu sentido lato, tais conceitos podem legitimar esse raciocínio de que o ‘outro’ – mesmo com identidade de outro – é imprescindível como elemento de uma dialética de equilibração (Hegel), como também podem auxiliar o entendimento da violência ‘cordial’ (passional) das torcidas organizadas, talvez, mais do que o conceito de guerra e mesmo de violência simbólica.
Mais ainda: muitas dessas práticas são manifestações da violência no futebol, e não do futebol.”
[Adaptado de Maurício Murad, ‘A Violência e o Futebol’, 2007]

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