No olho do furacão

Por Rodrigo Tupinamba Carvao
em 25/05/2015 |
Categorias: Sem categoria
Caríssimos (as),
Nesta fase do ano começamos a preparar os alunos para as competições. As turmas a partir de 06 anos entraram na disputa do ‘Torneio à Vera’, uma alusão às brincadeiras infantis de antigamente, quando algo podia ser à brinca (se não estivesse valendo pontos), ou à vera, quando era pra valer! Os alunos se enfrentam nas próprias turmas nos dias normais de aula, ao longo de 01 mês; a ideia é que possam progredir assim até as competições mais difíceis, aquelas em dias especiais, contra jogadores e equipes de outras turmas e até outros clubes. As turmas mais novinhas, de 04 a 06 anos, ainda não participam de nenhuma competição, pois entendemos que as aulas comuns do Chutebol já são o estímulo necessário na montanha-russa de vitórias e derrotas. 

Pois bem: é um momento que consideramos muito importante e mesmo delicado, na medida em que irão surgindo arranhões aqui e ali, por conta dos atritos inerentes às disputas. No entanto, de acordo com o que temos vivido ao longo dos anos, tais atritos vão sendo fontes de aprendizagem se puderem contar com um contorno por parte dos adultos (pais e professores), para que a criança e o adolescente possam dar a eles um significado. Explico.
A ideia consagrada é de que o esporte, por si só, é necessariamente fator de socialização. Falso. Porque costuma se supor que é o simples fato de colocar alguém no meio esportivo para competir que, como num passe de mágica, ele estará se socializando. Mas não é bem assim que acontece. Não basta estar cercado de gente para se socializar. Quem nunca se sentiu numa multidão? O que se propõe chamar socialização pressupõe experimentar afetos diversos (sentidos como bons e ruins) para que as habilidades sociais vão aos poucos amadurecendo.
No olho do furacão surgem questões como “será que eu sou bom?”; “o que meu time acha de mim?”; “estou agradando ao meu pai na arquibancada?”; “estou fazendo como o professor quer que eu faça?” – fatalmente vão surgir ao sabor do desempenho e do imaginário de cada um. Noves fora as reações mais diversas àquilo que é próprio do futebol, como fazer um gol contra, acertar um drible sensacional ou decidir uma partida no último segundo. É nesse caldo quente que os jogadores vão se relacionar com seus pares (amigos de time e adversários), e as cobranças e desentendimentos, bem como os gestos de apoio e a amizade, vão ganhando corpo.
Daí que diante de tudo isso está o adulto. E é preciso ter olhos para ver. Na posição que ocupo, falo da condição de professor. Penso que, se quisermos aproveitar a experiência da competição para facilitar de verdade a socialização dos alunos, temos a tarefa de dar uma borda, um contorno que os ajude a dar um sentido às suas próprias ações. Senão, a chance de descambar para a estupidez é muito grande. O futebol brasileiro que o diga.
Por isso começamos com um torneio de 01 mês, dentro da própria turma e nos dias de aula: para lavar roupa suja em casa. Assim, se fulaninho está tratando mal o colega que não joga tão bem; se beltrano reage com deboche quando vence de goleada; se sicrano se abate de maneira desproporcional quando perde, tudo isso deve contar com a participação do professor no sentido de expor à turma estas questões, pedir a opinião dos alunos e, mesmo, dizer (como adulto) o que pensa disto ou daquilo. Impor certos limites, mediar conflitos, imaginar saídas. Com a dificuldade adicional de fugir tanto do politicamente correto (para não tirar a naturalidade das emoções), como dos excessos que levam aos estereótipos bobalhões de ‘winner’ e ‘looser’. Ufa! Não é fácil…
Tal é o processo de socialização que considero o mais legítimo: poder experimentar as emoções, estabelecer as relações e contar com a ajuda do adulto para dar um contorno. Para saber se é aquilo mesmo. Insisto: para dar um sentido às suas próprias ações. No fundo, talvez seja o que todos buscamos de alguma maneira. Tenho percebido que, no frigir dos ovos, aqueles que melhor aproveitam o esporte conseguem um certo equilíbrio entre a vontade de vencer e o simples (porém nobre) prazer de praticá-lo. 
Quando sinto o aluno avançar na maturidade de perceber que se empenha, chuta, se rala, sua, discute, volta atrás, pede desculpas, chora, ri e comemora – “apenas” porque se diverte jogando, considero que o projeto está caminhando. Se a chapa esquenta, costumo perguntar: ‘Por que vocês estão aqui mesmo, hein?’. Até alguém ter a coragem de lembrar: ‘Porque a gente adora futebol!’ – e aí a gente recupera o sentido de se empenhar tanto!
Afinal, não é de hoje que lembramos deste cantinho que, sem adversário, não há jogo; adversário não é inimigo. Quem sabe competir sabe, antes, se divertir.
Aquele abraço, saudações esportivas

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5 Comments

  1. Leana maio 25, 2015 at 11:21 am - Reply

    Exatamente isso, Rodrigo.
    Abc
    Leana

  2. Bruno Levinson maio 25, 2015 at 11:22 am - Reply

    Rodrigo,

    Muito bacana seus textos, seus conceitos, sua forma de enxergar o esporte e tudo mais. Parabéns!!

    Abração e Boa Semana!!

  3. Nahman Armony maio 25, 2015 at 11:23 am - Reply

    Muito bom Rodrigo. Gostei. Um abraço. Nahman

  4. Estêvão Kopschitz X. Bastos maio 25, 2015 at 3:28 pm - Reply

    Também gostei muito.

  5. Marcos maio 27, 2015 at 12:45 pm - Reply

    É isso ai. Abs

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